Por Francis Ivanovich.
– Amigos e amigas, socorro, minha vida é um tédio!
Explico: Olho as fotografias, vídeos de toda gente no Instagram, Face, Twitter, YouTube etc., fico deprimido com os meus dias tão sem graça. Essa gente é tão feliz, cheia de amigos (seguidores)! Sempre estão sorrindo, fazendo coisas interessantes, viajando pelo mundo, vivendo aventuras, a plenitude da vida. Parecem artistas de cinema dos anos dourados de Hollywood.
Olho para a minha vida e fico me perguntando se já não morri? Meus dias são tão monótonos, com intenso trabalho emocional, contas a pagar, 24 horas planejando, pensando, escrevendo, pesquisando, tentando abrir uma porta “ao pé de uma parede sem porta” (Pessoa).
Vez por outra saio com uma amiga, como no último domingo em que almocei com a querida Juliana Mansur, uma tarde agradável; ou vou ao aniversário de um amigo querido, Paulo Virgílio, num normal, sem registros fotográficos exibicionistas para a rede.
Não consigo entender qual o sentido de exibir para o mundo um encontro de amigos ou parentes em sua casa ou num restaurante, não entendo. Vejo esses momentos como um ritual sagrado em que se celebra a amizade, não se tratando de um espetáculo ou uma cena de um filme de Fellini.
Creio que eu esteja vencido, como as mercadorias que na embalagem exibem um carimbo com data e hora superadas, um produto que resiste na prateleira do acaso, fruto de um relapso gerente da loja da sua existência.
Sim, amigos e amigas, definitivamente não posso competir com essa gente tão interessante, tão maravilhosa, com a vida tão repleta de sabores. Jogo a toalha e assumo: sou o mais sem graça dos homens, um chato de galocha.
Me cabe a caminhada pela manhã, quando admiro a paisagem natural e monumental do Rio; uma pedalada com o capacete a proteger minha careca contra as cabeçadas da vida; ida ao supermercado comprar pão de milho e manteiga (só alguém tão sem graça compra pão de milho?); um almoço prato-feito no restaurante da esquina; uma passada na livraria a fim de descobrir um título novo que não irei comprar; ou assistir no Netflix, Seinfeld (recomendo), série antiga, quando as pessoas marcavam encontros reais pelo telefone.
Toda essa gente das redes é artista, malabarista, mágico, celebridade, tem respostas para tudo, sabe o caminho da felicidade, saúde, bem-estar, a moda e o físico perfeito. Amigos e amigas, devo ser um alienígena, um ET vindo de uma planeta mais parado do que uma aldeia no interior de Portugal.
No Instagram tenho 44 seguidores, todos eu conheço de fato, são amigos e conhecidos, fico até com vergonha. Devo ser motivo da chacota para essa gente que possui milhares de seguidores. Meu Face não ultrapassou 300 amigos. Minhas curtidas não atingem dúzias por postagem.
Também não é para menos, uso as redes para divulgar um texto medíocre (como este), um filme baixo orçamento (O Homem de Escrever), uma nova peça teatral que a crítica destruirá, a fotografia da minha bicicleta diante do mar num dia nublado, uma tela que pintei apenas para passar o tempo, que jamais será um Picasso. Definitivamente não pertenço a este mundo das redes. Sou banal.
Depois de navegar um pouco pelas redes, constatar a minha mediocridade, instintivamente pego um livro na minha estante improvisada, sem olhar a capa:
Poemas de Khliébnikov, com seleção, tradução e notas de Marco Lucchesi, editora Bem-Te-Vi; um poeta russo que essa gente feliz das redes certamente ignora.
Abro-o e ele me diz um poema:
” A lei dos balanços determina
o uso de sapatos ora largos, ora apertados.
Que faça dia, que faça noite,
Que reinem sobre a terra, ora o rinoceronte, ora o homem”.
Fecho o livro e fico maravilhado com este tesouro. Um grande poema! A poesia me invade o coração e me faz sentir vivo outra vez, real, trivialmente HUMANO.
Minha existência neste mundo volta a ter sentido.
-SPACIBA, KHLIÉBNIKOV! (Obrigado, em russo)